Não Sei Desenhar Ͱ99 - 25/08/23
então quer dizer que a próxima é a edição 100. Eu sei contar
Eu não sei quantos de vocês aqui sabem mas eu sou DJ nas horas vagas. Ou pelo menos finjo que sou. Eu tento. Sempre toquei nuns rolês mais alternativos aqui da região, tocando umas coisas ou muito pop ou muito desconhecidas, ou as duas coisas juntas. Isso com um equipamentozinho simples, basicaço, sem muita pretensão. Num certo momento, depois de anos tocando, chegou num ponto da minha carreira em que eu me vi numa situação de decidir que ou eu investia num equipamento mais parrudo e treinava pra melhorar tecnicamente ou meio que largava de mão de tocar, porque na época eu acho que tava um pouco de saco cheio de gente chata no rolê e etc.
Bom, aí veio a pandemia e decidiram por mim.
Passado esse ligeiro inconveniente, a coceira de tocar surgiu no começo de 2023 (afinal no fundo eu gosto de fazer isso) e arranjei uma controladora seminova pra voltar pras carrapetas. E estamos aí nessa situação.
Aí que me convidam – na verdade, colocam meu nome no cartaz antes de me perguntar se eu tava disponível na data – pra tocar entre bandas de um show de uma banda de roque nacional numa casa grande da região. Aceito. Claro, por que não? Bora. Estamos aí.
Eu abro a noite tocando pra um público meio miado que ficava se escondendo da chuva do jeito que dava. Antes da atração principal, tocariam duas bandas e eu entre elas. A primeira formada só por calvos de barba tocava uns covers de Planet Hemp, Sublime, Offspring, um lance mais obviamente pesado assim. A segunda, uns Paramore, emocore pop anos 2000-2010, bem fofinho e popzão mesmo.
Tentando na medida do possível me adequar ao estilo de cada banda pra fazer uma transição coesa, me esqueço completamente que tinha a primeira banda e começo a mandar uns pop completamente nada a ver por que na minha cabeça já teria o som fofo na sequência. Aí dá-lhe Michael Jackson, Beyoncé, Rihanna versão pagode pra banda começar mandando Rage Against The Machine.
Quando parou de chover, parte do público começou a acumular em volta do palco onde eu tocava e todo mundo me olhava como se eu fosse um alienígena. Poucas vezes vi um público tão esquisito. Nada fazia sentido. E eu cada vez mais nervoso, não sabia nem que tipo de música escolher. Que música essa gente gosta? Roque nacional? Não tinha nada disso em lugar nenhum no meu computador. Olha minha cara de quem vai tocar Charlie Brown Jr. porra
A pedidos de um dos organizadores, parti pra um lance mainstream descarado depois do show principal (o que, inclusive, não estava combinado previamente... era pra eu tocar só entre as bandas mesmo) pra ver se segurava a galera pra gastar mais no bar. Por sinal foi muito logo depois porque o som mecânico da banda principal tava tocando Offspring do nada e um cara da organização mandou eu começar enquanto o som deles tava rolando. E eu mandando Sambô – Sunday Bloody Sunday pois HUMOR. Não sei se alguém entendeu mas no fim um punhado de malucos ficou enquanto eu tocava uns hip-hop anos 2000 e uma série de escolhas musicais muito pouco coerentes até pra mim. Parti pra uns funks cariocas clássicos e tal e até certo ponto funcionou. Pelo menos até o programa de discotecar resolver dar um problema que NUNCA tinha dado em 10 anos nesta indústria fundamental, deixando as músicas com metade da velocidade. Pro bem ou pro mal, meu set acabou mais cedo. Indo embora de mãos dadas com a derrota, é claro que fura um pneu do meu carro, às quatro da manhã de uma sexta-feira.
Moral da história? Se possível, nunca toque num show do Detonautas1.
Saiu recentemente um registro foda de uma das minhas bandas preferidas da vida, o Sonic Youth. É supostamente o último show deles, em Nova York, em 2011 e ou eu muito me engano ou o fim da banda já tava meio escancarado quando eles anunciaram essa leva de shows - que incluíram um show no Brasil que eu infelizmente só consegui ver tendo baixado (e, até onde eu saiba, esse sim é o último show deles). A banda acabaria quando a baixista, Kim Gordon, descobriu que o marido dela, o guitarrista Thurston Moore, tinha uma amante de sei lá quanto tempo. Questões. De qualquer maneira, o álbum é mais uma prova de como a banda era boa: a simplicidade do pós-punk e a destruição dos limites do que é uma banda de rock em termos sonoros, a dissonância e a microfonia e as afinações malucas e a beleza que pode surgir disso tudo. Não tem todos os hits aqui como poderia se esperar, mas eles desenterram algumas coisas e ainda fazem a melhor versão de Kill Yr. Idols.
novo da Saya Gray, ela faz um pop meio experimental com umas produções que lembram muito as da SOPHIE, esses lances de PC Music e coisarada
na área do soul mais clássico/r’n’b, tem o novo da ANOHNI com o Anthony and the Johnsons
Babel-17, do Samuel R. Delany, é uma doideira. Saiu originalmente em 1966 mas aparentemente só há pouco tempo chegou no Brasil, numa edição única junto com outra novela dele, Estrela Imperial (cuja edição, inclusive, não tem contracapa. Tu vira o livro de cabeça pra baixo e ele vira a capa da outra história). É muito surpreendente e inventivo, uma história de ficção científica meio de espionagem num pedaço do universo onde as pessoas fazem cirurgias estéticas extremas (algo quase anime) e uma guerra tá rolando no plano de fundo e trisais são algo praticamente normalizado. A personagem principal é uma poetisa/linguista e o mote da história é justamente ela tentando desvendar um idioma estranhamente complexo, que é justamente o Babel-17 do título. Muito sagaz e cheio de descrições bizarras – em certo momento duas situações ocorrem ao mesmo tempo e a diagramação muda, acomodando caixas de texto com fundo preto e letra clara no meio dos parágrafos padrão – e cheio de ideias e situações interessantes e indo além em certas questões que eu não vou falar pra não dar spoiler. Mas esse rapaz é bom. Quem sabe poderiam até cogitar fazer uma série a partir de algum livro dele, encabeçada pelo Neil Gaiman. Opa.
(Inclusive vale checar o perfil que a New Yorker fez do Delany)
temporadas novas de The Bear e How To With John Wilson começando muito bem… mais sobre isso no futuro????
Estamos de volta ao maravilhoso mundo dos ricos com mais um refri de rico. Diretamente de Londres, a Ginger Beer do Franklin & Sons desde 1888. Eu nem era nascido nessa época.
Tu sabe que o negócio é realmente de rico quando precisa de uma ferramenta muito rara e chique pra abrir a garrafa: um abridor de garrafa. Eu nem sequer tenho um desses em casa, tive que usar um martelo.
Como um refri de gengibre com limão, o soco na boca quando vem o sabor é inevitável. O gengibre salta como tem que ser, passa rasgando e o limão não passa de um retrogosto que parece que tá brincando de esconder com as papilas gustativas. Ah, o sabor de ser rico. Beber isso foi como se eu estivesse num clube de gentlemen, tomando chá com homens vitorianos de fraque e cartola. Eu tomaria o chá e o gosto ficaria estragado pelo sabor agressivo do refri e eu fingiria que estava adorando, arqueando as sobrancelhas de uma maneira muito fancy. O sabor que fica é o que se espera de uma bebida com gás, gengibre e limão: como se tivessem passado uma lixa 80 na garganta. Pra completar, essa garrafa dá uma ótima decoração. Nota: 7/10. Mas um 7 muito rico, dourado e cheio de arabescos.
uma banda que confia tanto no taco dos seus 20 anos de carreira que toca vários covers no meio, de Lulu Santos a O Rappa.