Começou o Big Brother Brasil!
Finalmente! A casa mais vigiada do Brasil está de volta. E pra facilitar a vida de todos que não tiveram a oportunidade de prestigiar o programa, vou fazer aqui um resumo de tudo que aconteceu nos primeiros dias de confinamento dos brothers:
No primeiro dia: todos entraram na casa! Alegria, descontração, gente bonita e feliz! Ao final do dia, três participantes tropeçaram e caíram num poço de lava
No segundo dia: uma equipe da SWAT entrou pela claraboia. Quatro brothers foram presos. Então rolou uma festa com o tema Anos 80
No terceiro dia: subiu aos céus
No quarto dia: prova do líder. Um dos brothers começou a convencer os outros de que estavam sendo vigiados o tempo inteiro. Eles não acreditaram. Então perceberam que aquilo era um programa de TV. Assustados, eles fugiram da casa e começaram a avisar a todos que encontravam pela frente de que aquilo tudo era um programa de TV. As pessoas se assustaram e começaram a seguí-los e fugiram de suas casas. Todos juntos fugiram e então criaram uma seita que após cinco meses tinha 100 milhões de fiéis. O brother lá do começo tornou-se o líder deles e venceu a prova.
No quinto dia: formação de paredão. Os brothers pegaram tijolo e cimento e levantaram uma parede de 5m de altura
Fiquem ligadinhos que em breve vem muito mais BBB por aí!
E a Microsoft comprou a Activision/Blizzard por US$70.000.000,00, o equivalente a R$382.730.264,65.


Para efeito de comparação, segue aqui uma lista de coisas que podem ser compradas com esse dinheiro:
Saiu uma nova do Guerilla Toss, banda de Boston especializada em DOIDEIRAS barulhentas com algo de eletrônico
E agora, uma pausa para nossos patrocinadores
E esse lance dos draminhas de Kwai? É a nova novela mexicana. Que conceito campeão. Deu até vontade de fazer uns. Aguarde e confie (não).
RIP Elza Soares :(
Como se não bastasse toda a carreira e história de vida, ainda lançou um dos melhores álbuns brasileiros dos últimos anos, A Mulher Do Fim do Mundo.
Não tem nada que eu possa falar que vá acrescentar qualquer coisa, mas me impressiona muito ela nunca ter parado de cantar e manter-se sempre lançando coisa nova, se renovando, fazendo show e coisa e tal. 91 anos e, pelo que contaram, foi em paz.
Davi
De vez em quando Davi se pegava perguntando o que realmente estava fazendo ali e por que Maravilha do Sul tinha um observatório astronômico. Mas só de vez em quando. O trabalho era simples: ele tinha que ir ao observatório toda noite e, basicamente, vigiar o céu. Era pra isso que estava sendo bem pago. Bem pago o suficiente pra ter saído da casa dos seus pais aos dezenove anos e ir morar sozinho, ainda que na prática morasse a apenas algumas quadras de distância deles. Sua mãe sempre quis que ele fosse um homem responsável e aparentemente era isso que ele estava fazendo.
Tinha sido contratado há quase um ano e meio e era mais um na grande fila de vigilantes do céu do observatório de Maravilha do Sul. Por algum motivo, os outros não haviam durado muito. Ele tecnicamente não era (ainda) um astrônomo. Estudava pra isso e amava a astronomia mas tinha dúvidas se aquela era realmente a função de um astrônomo. A descrição do trabalho, quando se candidatou ao emprego, era basicamente olhar pro céu e ver se algo diferente acontecia, e então avisar à polícia ou ao quartel do exército locais. Era como se aquele emprego fosse o que Maravilha do Sul achava que era o trabalho de um astrônomo. Aí alguém patrocinou a compra de um telescópio, montou um observatório no meio do nada e enfiou alguém pra ficar olhando ali. Provavelmente esse era o motivo da alta rotatividade. Astrônomos de verdade viriam trabalhar ali e acabavam se deparando com a função de um segurança de prédio. Por Davi, tudo bem – pelo menos por enquanto.
- Bom, primeiro, sinto muito. – mentiu o policial, com um bloco de anotações e uma caneta na mão.
- Tudo bem. – disse Davi.
- Então. Que hora você chega no trabalho?
- Umas oito da noite, toda noite. Pego o carro da firma e dirijo por uma meia hora até o observatório.
- Qual é o carro da firma?
- Um Gol, bola. Dois mil e dois.
- Certo. E você trabalha lá só observando, sozinho?
- Isso.
Quando chegava no observatório, fazia um café e olhava pra tela do computador. E era isso. Ainda assim, Davi tinha pra si que não podia errar. Seu chefe aparecia de vez em quando e eles conversavam sobre o Maravilha Futebol Clube, do qual o homem era o técnico. Melquíades vivia insistindo pra Davi jogar no time. Uma partidinha que fosse.
- Vamo lá, rapaz! A gente precisa de alguém da tua cor no time.
Davi respondia sempre com um sorriso amarelo dizendo que não era pra ele mas cada vez mais se incomodava com aquilo.
Outro que aparecia de vez em quando era Borba, o delegado. Davi percebia que era ele chegando porque o ronco da caminhonete dele era muito parecido com o ronco da respiração do próprio Borba, um som que se misturava com o esfregar de couro no metal e com seus passos preguiçosos na brita que envolvia o observatório. Davi tinha certeza que ele só ia ali pra conferir se ele não tinha roubado nada. Chegava, perguntava como estava o céu, analisava o escritório procurando por alguma coisa, conversava sobre amenidades, não encontrava nada de diferente e ia embora. Mas Davi se identificava com ele no que tange à falta do que fazer.
Seu corpo já tinha se acostumado. Ia dormir às oito da manhã, e no caminho de volta para casa encontrava sempre as mesmas pessoas indo para o trabalho. O tio no sítio com as vacas. O cara com sono. O Cláudio da rádio. A dupla de senhoras fofoqueiras fazendo cooper que sempre olhavam pra ele como se ele não pertencesse àquele lugar. O maluco que sempre andava de blazer sem camisa. A gatinha do mercado que sempre olhava de volta pra ele. O amigo dele com seu Golf rebaixado tocando o funk do momento. Acordava entre as duas ou três da tarde, tomava café “da manhã” em sua quitinete e ia fazer as coisas do dia-a-dia. Ia espairecer, jogar videogame, ver série, visitar pessoas na medida do possível. Às sete da noite se preparava e ia para o trabalho novamente. Pegava o carro da empresa e fazia o trajeto de volta, sem saber se tinha vontade pra isso ou não. Era como se seu corpo fizesse sozinho o trabalho do dia e a sua mente participasse só pela companhia. No trabalho, além de olhar pro computador às vezes, lia uns livros sobre astronomia e via séries. Saía às seis da manhã do observatório.
No caminho de volta para casa encontrava sempre as mesmas pessoas indo para o trabalho. O tio no sítio com as vacas. O cara com sono. O Cláudio da rádio. A dupla de senhoras fofoqueiras fazendo cooper que sempre olhavam pra ele como se ele não pertencesse àquele lugar. O maluco que sempre andava de blazer sem camisa. A gatinha do mercado que sempre olhava de volta pra ele. O amigo dele com seu Golf rebaixado tocando o funk do momento.
Seu corpo já tinha se acostumado.
- É basicamente isso, é isso que eu faço. – completou Davi.
- OK. – anotou o policial. – E o Tavares? Vocês já se conheciam?
O Tavares já conhecia Davi de vista. O menino já tinha levado o Golzinho da empresa algumas vezes na Oficina Mecânica & Açougue do Tonhão, onde Tavares trabalhava basicamente desde sempre. Tinha tido problemas na suspensão, tinha que trocar a pastilha do freio. Sabia quem eram o pai e a mãe dele. Tavares achava inevitável: era uma das poucas famílias negras na cidade. Se visse ele na rua, saberia quem era. No máximo.
Tinha acordado um pouco mais empolgado que o normal porque era uma quinta-feira, dia em que depois do serviço rolaria churrasco na oficina. Sob reclamações de sua esposa, abriu o porta-malas de seu Santana Quantum e meteu uma caixa térmica, depois fechou e abriu a porta da garagem de casa. Quando foi entrar no carro para partir, lembrou-se da antena do rádio do carro. Tinha algum problema com ela: ela não encolhia mais quando o carro desligava. Ficava aquela ponta de um metro pra cima o tempo todo. Tavares prometeu a si mesmo, como vinha fazendo desde que começou o problema, há cinco meses, que naquele dia consertaria isso. Ligou o carro, botou na Rádio Maravilha e aumentou o volume para não ouvir sua mulher berrando coisas que ele escolhia ignorar e foi para o trabalho.
Era um daqueles dias que se confundiam com os outros.
- Eu tinha ido jantar fora porque tava sem comida em casa e sem vontade de cozinhar.
- Jantou onde? – perguntou o policial.
- Na pizzaria.
- Pizzaria...?
- A Funerária & Pizzaria do Paulinho.
- Essa pizzaria. – anotou em seu caderno amassado. - OK. Pediu o quê?
- Uma média de Calabresa.
- Manjada essa hein.
- O quê? Eu gosto de Calabresa, qual o problema?
- Tá bom. – anotou. – Comeu a Calabresa, e o quê mais? Bebida?
- Tomei uma Coca com limão e gelo.
- Com limão e gelo, ainda...
- O que que tem?
- Nada. Só isso? Uma cervejinha, cachaça...?
- Nada, só a Coca mesmo.
- Beleza. – anotou.
- Você não acredita em mim?
- Só tô tentando fazer com que você se lembre com o maior número de detalhes possíveis. Pode seguir com a história.
- Comi a pizza, bebi a Coca e paguei.
- Dinheiro ou cartão?
- Cartão.
A garçonete raspou o cartão na maquininha. Não passou.
- O quê?
- Não passou, moço.
- Que estranho. Tenta de novo.
- Tá bom...
Estranhamente a contragosto, a mulher passou o cartão de novo. Um símbolo animado no visor da máquina ficou girando abaixo da palavra “processando”.
- Às vezes acontece. Com algumas pessoas, sabe. – disse ela.
Davi não respondeu. Os dedos apreensivos apoiados no balcão. O símbolo girava, enquanto Davi teve a impressão de que a mulher analisava a forma como ele estava vestido.
- Tava boa a pizza? – ela perguntou com um sorrisinho forçado.
- Tava sim.
A maquininha apitou e o texto dizendo “transação aprovada” apareceu. Davi disse que não precisava da sua via, pegou a caixa da pizza com o resto do que não comeu e saiu.
Meio pesado da janta, caminhou devagar pela rua. Abriu a caixa pra ver se estava tudo certo com a pizza, tudo OK. No processo, passou aos poucos pela faixa de pedestres enjambrada sobre um pedaço de asfalto que por sua vez cobria um trecho de paralelepípedos. A faixa o levaria para a praça da cidade e depois para a casa.
Tavares tinha saído da oficina antes do que gostaria. Brigou com a mulher pelo telefone (tinha que buscar seu filho sabe lá onde) e sob risadas dos colegas entrou no carro e partiu. Embriagado feito um gambá, levou uma última lata de Schin pra ir tomando no caminho. Botou o rádio num volume que fazia estourar as caixas de som do carro e dirigiu com o braço esquerdo pra fora do carro, cantando/berrando junto com a música.
- Nanana mar... coração... raio de saudade, meteoro da paixão, explosão de sentimento que eu não pude acreditar, AH! – gritou. – Como é bom poder te amar...
Aconteceu no momento em que ele virava um gole maior de cerveja a ponto de se babar. Passava pela praça, o pé apoiado no acelerador como uma pedra. Se aproximou da faixa de pedestres.
Davi olhou rapidamente para o lado, como se fosse adiantar alguma coisa. Não teve tempo de pensar no que faria. Percebeu dois raios de luz se aproximando dele e, logo atrás, um homem ao volante bebendo uma lata de cerveja. Os raios de luz passaram por baixo dele enquanto ele e a pizza rodaram por cima do capô e logo depois acertaram o vidro do carro. No caminho, a antena do carro atravessou o olho direito de Davi. Ele continuou girando enquanto a pizza voava por cima dele, os pedaços de calabresa se espalhando por cima dele, sua trajetória formando um arco no ar. Davi atingiu o vidro traseiro de frente, seu olho esquerdo se arrastando sobre o vidro e então ele caiu de lado sobre os paralelepípedos. Sentiu a caixa da pizza cair sobre seu peito e ouviu o barulho do carro freando, tarde demais. Não era capaz de se levantar, ou de abrir os olhos. Seu ombro doía, seus joelhos. Gemeu e se balançou.
Não demorou para chegar ajuda. A primeira pessoa gritou:
- Tavares, tá tudo bem?
Davi ouviu um resmungo de dentro do carro, a porta se abriu. Tentou se levantar para reclamar mas estava sem forças, caiu de novo. Quis abrir os olhos e então se deu conta que seus olhos já estavam abertos. Ele só não conseguia ver nada. Sua boca se abriu precedendo um grito de desespero.
- Hm. – anotou o policial.
- Foi isso. – disse Davi, com uma faixa que tapava seus olhos e uma tala num braço. – Deve ter uns pedaços de pizza no chão ainda.
- É, deve ter mesmo. Bom, tá certo então. Mais alguma coisa que tu ache importante relatar pra mim?
- Hm... não, acho que é isso mesmo.
- Afirmativo. Bom, vou ali falar com o Tavares então. Tu tá liberado.
Davi assentiu mas não tinha pra onde ir, ficaria ali esperando a ajuda de sua mãe que haviam lhe prometido. As luzes vermelhas dos carros da polícia e da ambulância batiam em seu rosto mas ele não era capaz de perceber. Os curiosos se juntaram e olhavam pro acidente e pra ele, olhares que, mesmo sem ver, sentia que em última instância não se importavam tanto com ele. A fofoca começava a se espalhar, como uma tsunami que cobria as casas e as pessoas em volta. Longe dele, diriam que ele estava bêbado, que ele se jogou na frente do carro, “pobre do Tavares”, “o que esse neguinho aprontou agora”, “aposto que só fez pra chamar a atenção”. De perto, ouviria palavras de pena, mãos em seu ombro, tapinha nas costas.
Seu corpo já tinha se acostumado. E agora teria que se acostumar de novo.
*
O delegado Borba lia as anotações de seu subordinado. Nem terminou de ler e entregou o papel de volta.
- Pode arquivar isso aí. – mandou.
- E o observatório, como fica? Vai ter que que contratar alguém novo. – falou o policial enquanto dobrava o papel de qualquer jeito.
Borba respirou fundo, soando como um trator que acelerava. Cruzou os braços.
- É nisso que eu tô pensando.
O computador do observatório ficava ligado sempre, mesmo que não houvesse ninguém para vê-lo. A tela do computador mostrou para ninguém a imagem do telescópio. Algo passava por ali. Algo que não costumava passar, algo que ninguém nunca antes tinha visto. Na tela, era preto e branco mas se alguém visse a olho nu, veria verde. O motivo pelo qual o observatório tinha sido criado. Algo se aproximava de Maravilha do Sul. E ninguém viu chegando.
Agora com licença que vou remover toxinas do meu corpo colocando uma cebola roxa na sola do meu pé